Encontro com Ministro
O Ministério do Esporte iniciou nesta quinta-feira mais uma tentativa de resolver os problemas de brigas entre torcidas em estádios de futebol. Após mais um fim de semana marcado por cenas de violência, na partida entre Palmeiras e Corinthians, pelo Campeonato Paulista, o chefe da pasta, George Hilton, recebeu em Brasília representantes da Associação Nacional de Torcidas Organizadas (Anatorg) para discutir medidas que ajudem a solucionar a questão.
O ministro defendeu as uniformizadas e disse que ideias como a dissolução das instituições ou torcida única nos estádios não são positivas. O foco será voltado para a conscientização, individualização e responsabilização das pessoas que participam das brigas.
– As torcidas organizadas são importantes, precisam ser preservadas. Mas não se pode permitir que tenham em seu escopo delinquentes que praticam atos de violência. Elas precisam continuar, são manifestações importantes do esporte e precisam ser protegidas desses maus elementos que, segundo estudos, são em torno de 7% a 10% do total (de torcedores ligados às organizadas). (…) Tem que ter as duas torcidas. Temos que ter a cultura e dar o grito de paz – afirmou o ministro após o encontro.
De acordo com George Hilton, um grupo de trabalho será formado para definir as medidas que serão colocadas em prática. Além das organizadas, serão ouvidos também os clubes, polícias dos estados e o ministério da Justiça.
– Algumas ideias já estão sendo trabalhadas, como a criação de um banco de dados que venha a ter um cadastro nacional de todos os torcedores. Há também a ideia de criação de um serviço de disque-denúncia, que vai focar nos elementos que praticam atos criminosos e se travestem de torcedores – completou.
Não é a primeira vez que o Ministério do Esporte cria um grupo de trabalho para discutir o tema. Em dezembro de 2013, após a briga entre torcedores de Atlético-PR e Vasco, em Joinville, pela última rodada do Brasileirão, a pasta reuniu órgãos do governo e entidades envolvidas no futebol e apresentou nove medidas para conter a violência nos estádios. Porém, quase nenhuma foi colocada em prática. O próprio cadastro nacional dos torcedores – que o ministério tenta implantar desde 2011 – era um dos itens colocados como prioridade e que não saiu do papel.
O ministro George Hilton evitou comentar o fracasso de outras tentativas do Ministério do Esporte de resolver o problema da violência nos estádios e demonstrou confiança no sucesso desta nova iniciativa.
– Nós vamos fazer. Estamos dispostos. Há boa vontade do Ministério, das torcidas, dos clubes, da sociedade. O momento exige isso e temos que ter a responsabilidade para fazer que elas aconteçam. (…) Vamos fazer um trabalho forte de conscientização, com parceria com estados, governantes, os próprios clubes tem interesse nisso. A criação da Anatorg me parece deixar claro que as torcidas perceberam que tem que ter a parceria delas com o poder público. Há interesse de todos – concluiu.
Segundo o presidente da Anatorg, André Azevedo, o problema da violência nos estádios não está nas torcidas organizadas, mas na sociedade como um todo. Para ele, é importante desvincular os torcedores que brigam das instituições. Azevedo ainda fez questão de ressaltar que a intenção da associação é ajudar a reduzir as brigas relacionadas ao futebol, mas que não se ilude com o pensamento de que a entidade possa solucionar de vez a questão.
– A Anatorg não tem como objetivo solucionar um problema que é muito mais social do que das torcidas organizadas. Quando se fala em violência no futebol, até me incomoda, porque não acho que tenha violência no futebol. Acho que existe violência, e o futebol é só mais uma extensão de tudo que estamos acompanhando na rua. O cara que entra na torcida organizada tem como berço a nossa educação, nossa cultura. Estamos aqui para ajudar na discussão, tentar minimizar o problema e mostrar para a sociedade que as organizadas não são apenas aquilo que se noticia. Não são todos bandidos, marginais – afirmou.
Assim como o ministro do esporte, André Azevedo defendeu a identificação e punição dos torcedores que brigam. Segundo ele, se o Estado conseguisse aplicar as penas já previstas, estaria ajudando as torcidas organizadas.
– Nossa intenção é sempre defender a instituição, não o torcedor. O torcedor que arrume um advogado. A Anatorg em momento algum vai fazer isso. Nós até achamos que o sistema presta um desserviço às torcidas organizadas com a impunidade. Porque o cara comete o crime e depois é inserido novamente no mundo do futebol, e quem paga a conta não é ele. Você não vê o nome dele sendo citado, você vê o nome da instituição.
Sobre o combate interno aos brigões, André Azevedo admitiu que algumas torcidas acabam sedo coniventes com o problema. Porém, segundo ele, as instituições não têm como resolver sozinhas a questão.
– Existem torcidas que, às vezes, acabam sendo incoerentes no sentido de não fazer essas punições (internas). Não são todas, muitas já fazem. Agora, não pode cobrar das torcidas, de um presidente, uma pessoa física, que faça o trabalho do Estado. Se fizermos isso, podemos estar criando até um problema pessoal. A gente preside uma associação, uma torcida, mas não é policial. Não temos o poder do judiciário, do poder público, para punir. Internamente, muita coisa é feita, mas acaba não sendo divulgada. Agora, você pode até tirar o cara do seu cadastro, mas isso não impede que ele vá para o jogo, que use a camisa da sua torcida da mesma forma. Como vamos proibir o torcedor de entrar no estádio? Nós não podemos, a lei pode – concluiu.
Fundada em dezembro de 2014, a Anatorg vem atuando nos últimos dois meses no sentido de promover a paz entre torcidas rivais. Atos já foram realizados em estados como Pernambuco, Ceará, Goiás e Minas Gerais. Segundo os representantes da associação, 127 organizadas já estão filiadas, somando algo em torno de 1,5 milhão de torcedores.
– Em pouco tempo, já conseguimos promover um diálogo que nunca houve. Fizemos um encontro no Recife, onde as torcidas de Sport e Santa Cruz fizeram um rap para promover a paz. Fizemos encontro de todas as torcidas de Ceará e Fortaleza, para dialogarem, e houve uma repercussão boa. Estão fazendo um trabalho grande de socialização. A torcida do Ceará fez um aulão para preparar os membros para a prova do Enem, por exemplo. Foi uma campanha legal. Em Goiás, também fizemos um encontro das torcidas no Serra Dourada. Recentemente, reunimos as torcidas de Atlético-MG e Cruzeiro em Belo Horizonte – explicou o diretor da Anatorg, Flávio Coelho, o Frajola.
Ainda de acordo com Flávio, a próxima ação da associação para ajudar no combate à violência será promover, em São Paulo, um encontro entre torcidas de Atlético-PR e Vasco para selar a paz entre os dois lados após a briga de 2013.
[Fonte: Globo Esporte]